Usando palavras não-minhas vou tecendo uma historia de retalhos que conte meus insucessos. Porque perspectiva é ferramenta poderosa e ser vítima é sempre mais fácil.
Vejo o mundo em múltiplas óticas que não sei como compartilhar.
Vejo amores dissolvidos mesmo antes de qualquer enlaçar. Vejo a vida se esforçando para encontrar passagem, nas veias da cidade.
Vejo sorrisos maltratados, rostos restaurados de sorrisos desenhados, tão falsos e dissimulados quanto qualquer verdade contada.
Porque verdade sentida é diferente.
Vejo as poças de água nas calçadas esperando ser pisadas por algum sujeito que há de maldizê-las. Vejo a solidão em cada janela fechada, de cada cubículo amontoado que guarda fielmente as angústias de seus moradores.
Janelas suadas, paredes molhadas, alguém exagera na calefação. Alguém sente mais frio do que deveria, alguém precisa de amor. Quem não?
Vejo nuvens carregadas, pesadas, fartas e desistentes. Passam chorando, derramando lamúrias que ninguém há de ouvir.
Vejo tristezas negras desenhando sombras nos rostos alheios, que se escondem vergonhosos da chuva, da tristeza melancólica que banha a cidade, debaixo de seus vulneráveis guarda-chuvas. Vejo crianças e jovens senhoras, homens e mulheres que não se vêem. Vejo a ordem no caos permanente, das vidas da gente, que se preocupa sem precisar.
Porque preocupação precisa de algo concreto, não é certo?
Vejo as árvores secas, esguias, esforçando-se por entre os fios querendo fugir do concreto que as rodeiam. Vejo pássaros cruzarem tristes o céu que se escurece, o violeta último antes das estrelas.
É chegada a hora do retiro. É bem-vinda a hora do encontro com o desconhecido protegido pelas sombras.
Tudo tão fugaz como qualquer ruído que não insiste numa cidade triste.